sábado, 24 de novembro de 2007

O PRÍNCIPE - CAPÍTULO V

CAPÍTULO V
DE QUE MODO SE DEVAM GOVERNAR AS CIDADES OU PRINCIPADOS QUE, ANTES DE
SEREM OCUPADOS, VIVIAM COM AS SUAS PRÓPRIAS LEIS
(QUOMODO ADMINISTRANDAE SUNT CIVITATES VEL PRINCIPATUS, QUI ANTEQUAM
OCCUPARENTUR, SUIS LEGIBUS VIVEBANT)


Quando aqueles Estados que se conquistam, como foi dito, estão
habituados a viver com suas próprias leis e em liberdade, existem três
modos de conservá-los: o primeiro, arruiná-los; o outro, ir habitá-los
pessoalmente; o terceiro, deixá-los viver com suas leis, arrecadando
um tributo e criando em seu interior um governo de poucos, que se
conservam amigos, porque, sendo esse governo criado por aquele
príncipe, sabe que não pode permanecer sem sua amizade e seu poder, e
há que fazer tudo por conservá-los. Querendo preservar uma cidade
habituada a viver livre, mais facilmente que por qualquer outro modo
se a conserva por intermédio de seus cidadãos.


Como exemplos, existem os espartanos e os romanos. Os espartanos
conservaram Atenas e Tebas, nelas criando um governo de poucos;
todavia, perderam-nas. Os romanos, para manterem Cápua, Cartago e
Numância, destruíram-nas e não as perderam; quiseram conservar a
Grécia quase como o fizeram os espartanos, tornando-a livre e deixando-
lhe suas próprias leis e não o conseguiram: em razão disso, para
conservá-la, foram obrigados a destruir muitas cidades daquela
província.


É que, em verdade, não existe modo seguro para conservar tais
conquistas, senão a destruição. E quem se torne senhor de uma cidade
acostumada a viver livre e não a destrua, espere ser destruído por
ela, porque a mesma sempre encontra, para apoio de sua rebelião, o
nome da liberdade e o de suas antigas instituições, jamais esquecidas
seja pelo decurso do tempo, seja por benefícios recebidos. Por quanto
se faça e se proveja, se não se dissolvem ou desagregam os habitantes,
eles não esquecem aquele nome nem aquelas instituições, e logo, a cada
incidente, a eles recorrem como fez Pisa cem anos após estar submetida
aos florentinos.


Mas quando as cidades ou as províncias estão acostumadas a viver sob
um príncipe, extinta a dinastia, sendo de um lado afeitas a obedecer e
de outro não tendo o príncipe antigo, dificilmente chegam a acordo
para escolha de um outro príncipe, não sabem, enfim, viver em
liberdade: dessa forma, são mais lerdas para tomar das armas e, com
maior facilidade, pode um príncipe vencê-las e delas apoderar-se.
Contudo, nas repúblicas há mais vida, mais ódio, mais desejo de
vingança; não deixam nem podem deixar esmaecer a lembrança da antiga
liberdade: assim, o caminho mais seguro é destruí-las ou habitá-las
pessoalmente.

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